terça-feira, 25 de abril de 2017

Dias melhores virão (final)

Continuação de terça-feira
Você afirma que o crescimento econômico tem um limite e que nós já atingimos esse limiar, uma vez que um planeta finito não pode suportar crescimento infinito. O que acontece agora?
Poderíamos crescer um pouco mais. O planeta ainda oferece, por exemplo, florestas tropicais que podem ser desmatadas, peixes que podem ser pescados, petróleo, ar atmosférico etc. Se trabalharmos duro, podemos crescer por mais algumas décadas. Acontece que o custo desse crescimento só aumenta. Seria melhor parar agora. Como? Protegendo os recursos. Evitando que sejam tragados por máquinas e se convertam em dinheiro facilmente consumido. Para tanto, nosso sistema econômico precisa se transformar, pois da maneira como está estabelecido ele depende do crescimento, e quando esse crescimento se desacelera ou se extingue temos grandes problemas sociais, uma vez que a riqueza fica concentrada.
Em outras palavras, nosso sistema financeiro só funciona se houver crescimento, e ele faz com que os ricos fiquem ainda mais ricos. Se a economia está crescendo, ótimo, os ricos ficam cada vez mais ricos e as demais pessoas também têm chance de melhorar sua condição de vida. Mas, se a economia está retraída e os ricos continuam ficando mais e mais ricos, sobra cada vez menos para o restante da população. É o que está acontecendo agora. Em muitos lugares do mundo a classe média já está desaparecendo. Por isso, o fim o crescimento é um alerta para que mudemos o sistema econômico.
A alternativa ao modelo vigente seria uma economia baseada na colaboração e no compartilhamento?
Sem dúvida, esse é um caminho por meio do qual todos podem ficar mais ricos mesmo ganhando menos dinheiro, mesmo possuindo menos coisas, mesmo vivendo numa economia que está encolhendo. Nos Estados Unidos, toda casa tem um poderoso kit de ferramentas, equipamentos de ginástica etc. Agora me responda: durante quanto tempo na semana esses proprietários se valem dessas posses? Muitas dessas coisas poderiam ser perfeitamente compartilhadas. Esse é um exemplo de como podemos nos beneficiar desse novo modelo.
Como o dinheiro se insere nesse novo contexto?
Quero deixar claro que não considero o dinheiro contrário à colaboração. Muitas pessoas já aderiram ao sistema colaborativo e também usam dinheiro. O que defendo é uma mudança na natureza da moeda. Não vamos evoluir se os bancos centrais continuarem direcionando recursos monetários àqueles que já dispõem dele. Se você possui uma quantidade significativa de recursos financeiros, seria muito mais benéfico ao planeta se você pudesse emprestá-lo a quem precisa a juro zero, em vez de guardá-lo só para você ou de transformá-lo em mais e mais cifras. Essa corrente gera gratidão. Você pode fazer a diferença na vida dos amigos e conhecidos. E, quando precisar, eles estarão lá por você.
Você pode falar sobre a cultura da dádiva? Como ela se manifesta?
O Brasil está imerso na cultura da dádiva. Muito mais do que os Estados Unidos, pois cultura da dádiva é viver em comunidade, é dançar nas ruas de graça, como acontece aqui, é ajudar uns aos outros sem precisar contratar alguém para fazer isso, é consertar o banheiro do seu vizinho, que também irá ajudá-lo a consertar o seu ou estender a mão quando preciso for. Nos países desenvolvidos, as pessoas pagam por todas essas coisas. Para dançar, ouvir música, por serviços diversos, para que as crianças possam brincar, para fazer ginástica. Em suma, cultura da dádiva é doar presença, é se ajudar mutuamente.
"Cultura da dádiva é viver em comunidade, é dançar nas ruas de graça, é ajudar uns aos outros sem precisar contratar alguém para fazer isso"
Quais são suas expectativas para o Brasil?
Sinto que ainda dá tempo de o Brasil tomar um caminho diferente do caminho que o meu país tomou e veio prescrevendo para todas as pessoas na face da Terra, ou seja, um grande plano com instruções sobre como se desenvolver. Talvez, 50, 40 anos atrás essas instruções fossem convincentes e, naquele tempo, os Estados Unidos estivessem cheios de confiança de que sabiam o jeito certo de não apenas ser humano como também de como se relacionar com o planeta. Pensávamos que tínhamos as respostas, mas isso não é mais verdade, porque o nosso caminho, as nossas instruções não trouxeram os resultados esperados.
Segundo essas promessas, já era para vivermos um mundo perfeito, mas, ao invés disso, estamos imersos numa realidade oposta a qualquer utopia. Os níveis de depressão no meu país estão mais altos do que nunca, assim como os de obesidade. A expectativa de vida baixou em comparação com dez anos atrás. De várias maneiras nós não cumprimos o sonho que a ciência e a tecnologia nos ofereceram.
Nesse mundo mais bonito que nossos corações sabem ser possível, qual seria a maneira mais fértil de empregar o nosso tempo?
Seguir o caminho que você considera o mais bonito e que o faz se sentir vivo. Não estamos aqui apenas para sobreviver e buscar segurança, e sim para nos dedicarmos a algo que é belo e significativo para os nossos olhos. Quero encorajar as pessoas a confiarem nisso, pois quando confiamos conseguimos nos dedicar. Temos a oportunidade de fazer essa escolha, mesmo que, a princípio, ela assuste ou pareça audaciosa. Não precisa se tratar de algo heroico. Você não tem que se martirizar por não se sentir corajoso o suficiente. Confie. Você saberá quando o momento da mudança chegar.
Aí, então, será capaz de agradecer, por exemplo, ao emprego que o trouxe até aqui, mas que agora não mais fará parte da sua vida. Oportunidades aparecem no tempo certo, isto é, quando estamos preparados para elas. E tudo bem se cometermos erros. Pois tudo isso é parte de um território desconhecido. E o único jeito de conhecê-lo é explorando-o, aprendendo com os nossos equívocos.
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Nossa! Que entrevista rica em provocação de reflexões!

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