quinta-feira, 10 de janeiro de 2013

A necessidade da aprovação dos outros

A situação descrita a seguir é bastante comum quando alguém fala para uma plateia. Várias pessoas discordam de algo que foi dito, mas não se dispõem a interpelar quem fala. Então, surge alguém que diz algo que algumas delas gostariam de ter dito. Com o surgimento das atuais tecnologias, situação semelhante passou a ocorrer quando alguém posta uma mensagem em um blog ou a envia para uma lista de destinatários de e-mails.
É o que eu imagino que tenha ocorrido com o envio da última postagem (As lentilhas e o caminho de Diógenes) para a minha lista de e-mails. A diferença é que, pelo fato de a resposta ao e-mail não ter sido enviada para toda a lista, só o "palestrante ouviu" o que nela foi dito. Por considerar bastante interessante a opinião nela externada e imaginar que ela tenha passado pela cabeça de outras pessoas, resolvi publicar no blog a resposta recebida e o texto que enviei esclarecendo algumas coisas ditas na postagem e apresentando alguns desdobramentos feitos a partir dela e do e-mail recebido.
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Guedes,
Refletindo um pouco sobre sua mensagem me peguei num caminho "desviante". Resolvi te provocar.
Auto-respeito, auto-estima, defesa da própria dignidade. Não necessitar de aprovação, nem de reconhecimento, dos outros, também pode nos levar a caminhos desviantes. Desviantes do ser Humano, na perspectiva da socialização na qual nos desenvolvemos e da qual necessitamos para viver.
Preciso do outro e da sua aprovação. Sem isso não seria Humano.
Feliz 2013.
Em tempo, eu te aprovo.
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É muito bom saber que você encontra tempo para ler as minhas mensagens, refletir sobre elas e até respondê-las. E responder com provocações. Provocações, quando bem intencionadas, são algo muito bom, pois, além de mostrar percepções diferentes, instigam a pensar para respondê-las o que possibilita enriquecer a discussão sobre o tema em questão.
Refletindo sobre a sua provocação e considerando o que foi dito sobre aprovação dos outros, auto-respeito e defesa da dignidade, na história que usei na postagem, digo o seguinte. No meu entender, a história não diz que a aprovação dos outros seja desnecessária; o que diz é que ela não deve estar acima do auto-respeito e da defesa da dignidade. Infelizmente, vivemos em uma sociedade onde se paga por qualquer coisa que se deseje, e o que o caminho de Diógenes mostra é que se as moedas usadas para pagar a aprovação dos outros forem o auto-respeito e a defesa da dignidade o preço que estaremos pagando é demasiado caro.
Ao dizer que é na socialização que nos desenvolvemos você me faz lembrar uma frase de Roberto Crema da qual gosto muito: "Ninguém muda ninguém; ninguém muda sozinho; nós mudamos nos encontros." Portanto, concordo com você quando diz que precisamos do outro e da sua aprovação, mas, no meu entender, depende de quem seja o outro. E para defender esta afirmação recorro a um episódio da vida de Abraham Lincoln.
"Edward M. Stanton, Secretário da Guerra, disse, certa vez, que Lincoln era "um grande idiota". Stanton estava indignado porque Lincoln se intrometera nos seus assuntos. A fim de agradar a um político egoísta, Lincoln assinara uma ordem transferindo certos regimentos. Stanton não só se recusou a cumprir as ordens de Lincoln, como também jurou que Lincoln era um grande idiota, por ter assinado tal ordem. Que aconteceu? Quando contaram a Lincoln o que Stanton dissera contra ele, respondeu, calmamente: 'Se Stanton disse que eu sou um grande idiota, então é porque eu o devo ser, pois ele quase sempre tem razão. O que tenho a fazer é sair e verificar por mim mesmo.' Lincoln foi ver Stanton. Stanton convenceu-o de que a ordem estava errada – e Lincoln a anulou. Lincoln aceitava críticas quando sabia que eram honestas, baseadas em fatos e feitas com espírito construtivo."
Ou seja, pela opinião que tinha sobre Stanton, para Lincoln era importante a sua aprovação. Por sua vez, pela consciência que tinha de suas ações, para Stanton nem sempre era necessária a aprovação de Lincoln, embora fosse ele o Presidente da Nação.
É a crença de que para tudo é necessária a aprovação dos outros que dá sentido às duas frases de uma antiga charge de Millôr Fernandes reproduzida a seguir.

Desculpando-me pela ilegibilidade decorrente da qualidade da imagem, segue a transcrição das duas frases nela situadas na parte central à direita.

- Às vezes, para sobreviver, a gente tem que fazer certas coisas.
- Mas, depois de fazer certas coisas, pra que sobreviver?
Mas sobre aprovação dos outros eu ainda tenho algo a dizer. Na vida, algumas vezes precisamos da aprovação dos outros, mas em outras vezes são os outros que precisam da nossa, e é aqui que mora o perigo. Para fazer o que fez Hitler precisou da aprovação do povo alemão. Para fazer o que fez Gandhi precisou da aprovação dos indianos. Para a sociedade ser como é ela precisa da aprovação (por ações ou pela omissão) da maioria de seus integrantes. Ou seja, quando for a nossa vez de aprovar, precisamos ter consciência de quais ações estaremos aprovando.
Sim, o ser humano (entendido apenas como uma espécie superior aos animais irracionais) precisa do outro e de sua aprovação, mas, se considerarmos o que Abraham Maslow entende por ser humano, talvez a necessidade de aprovação não exista. Veja o que diz Roberto Crema sobre Abraham Maslow.
"Gosto muito desta provocação, que sempre evoco, do cientista e humanista Abraham Maslow, um dos pais da psicologia humanística: 'Num certo sentido, apenas os santos são a humanidade'. Ou seja, os demais não lograram o desabrochar deste embrião de plenitude encarnado em nós. Se você quiser saber quem são os verdadeiros seres humanos, recomendo que estude as existências de seres humanos plenos, popularmente conhecidos como santos. É preciso estudar seres humanos que deram certo."
Ou seja, os seres humanos que deram certo agiam independentemente da aprovação dos outros.
Lincoln aceitava críticas quando sabia que eram honestas, baseadas em fatos e feitas com espírito construtivo. E eu aceito provocações quando sei que são honestas e feitas com espírito construtivo. Você fez uma provocação e eu acabei este e-mail citando outra. Citando uma provocação de Abraham Maslow que tanto agrada a Roberto Crema, um autêntico ser humano com quem tive o privilégio de conviver durante alguns seminários da UNIPAZ.
Fico feliz por ser aprovado por você, pois assim como Lincoln respeitava Stanton eu também o respeito bastante. E também o aprovo.
Abraços,
Guedes
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Parece-me óbvio que esta postagem não esgota um tema tão polêmico. Ela é apenas o resultado de algumas reflexões provocadas por uma interessante resposta a um e-mail, mas quem sabe ela possa vir a ser uma provocadora de outras respostas e comentários interessantes. Repetindo algo já dito acima, digo que comentários bem-intencionados serão sempre bem-vindos, pois enriquecem a discussão sobre o tema proposto. Aliás, no meu entender, o maior ganho que pode ser obtido com um blog é, exatamente, a troca de opiniões - quando bem-intencionadas.

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